08 julho 2009

A torre - um projecto inovador em 1936-38

Torre de Sinalização e Manobra Ferroviária de Pinhal Novo

O projecto da Torre - também denominada cabine - foi elaborado, entre Maio e Setembro de 1936, na Companhia dos Caminhos de Ferro Portugueses (C.P.), pelo arquitecto Cottinelli Telmo, e a inauguração ocorreu em Outubro de 1938.

Um projecto inovador

A Torre de Sinalização constitui, do ponto de vista arquitectónico, um elemento de excepção e de originalidade para a sua época, na medida em que veio rasgar os princípios impostos pelo regime salazarista, no que se referia a normas arquitectónicas. O regime, censor e controlador da produção artística e intelectual, impunha a utilização de símbolos nacionalistas, como brasões e esferas armilares, por ex., e a imagem de uma arquitectura pseudo-nacional, com referências às casas típicas portuguesas regionais, caracterizadas pelo uso de certos elementos: beirados, telhados de quatro águas, telha, alpendres, embasamentos em pedra e cantarias, entre outros.

Para realçar a importância deste edifício, na altura, podemos estabelecer a seguinte comparação: apesar de nascerem na mesma altura - o projecto da Torre data de 1936, e o da Estação de 1931 - verifica-se uma forte diferença entre as obras.

A Torre impõe-se como um edifício modernista, de linhas geometrizadas e puras, despojado das linguagens estéticas e decorativas do passado, representativa do futuro e inserida numa linha contemporânea internacional; a Estação, por outro lado, é um edifício que - apesar da sua beleza e arte, em particular devidas ao revestimento com painéis de azulejos alusivos às actividades económicas e ao património natural e edificado da região - é uma construção seguidista da imagem e dos cânones que o regime da altura queria para a arquitectura de Estado.

Não deixa de ser irónico que o motivo que levou à construção da torre e à sua original configuração - muito estreita na base e alta, devido à exiguidade do espaço disponível - seja agora o motivo de eventual demolição.

Para que servem as torres de sinalização e manobra ferroviária ?

As torres de sinalização e manobra ferroviária são instrumentos que servem para accionar agulhas e sinais indispensáveis à circulação dos comboios.

Nos anos 30 do século XX, o sistema manual de alavancas - sistema Saxby -, controlado a partir de pequenas torres de madeira, com piso elevado e envidraçado (postos de encravamento mecânico), estava obsoleto e a ampliação de algumas estações impunha uma modernização do de equipamentos. Os comandos eléctricos de agulhas eram mais fiáveis e simples, permitiam a melhoria do serviço prestado ao público.

As novas torres seguiram o princípio volumétrico das antigas. O protótipo da torre elementar ficou definido na Torre da Estação de Ermesinde, depois desenvolvido nas torres edificadas nas estações da Régua e do Pinhal Novo.(1)

Por que consideramos importante preservar a Torre ?

No Pinhal Novo, a escassez de espaço disponível, em 1938, “para a implantação da nova torre de sinalização, na sequência de obras de transformação da estação, justificava a adopção de uma estrutura fora do comum. Pretendia-se que a torre fosse construida sobre uma base tão reduzida quanto possível de forma a não constituir um obstáculo ao traçado mais racional das vias sobre o terreno. (…)

Verdadeiro tour-de-force de engenharia, essa «invulgar estrutura na arte de edificar», como foi considerada, dava a Cottinelli o pretexto e a oportunidade de projectar uma composição que contrariava os dogmas fundamentais da doutrina académica.” O uso do betão - inovação na época -, permitiu que a base fosse muito estreita, e a construção se alargasse, de baixo para cima. “O aparente desequilíbrio da forma era naturalmente compensado pela desmaterialização do volume superior - a caixa cristalina da sala de manobra - com as superfícies inteiramente envidraçadas entre uma finíssima retícula de caixilhos metálicos e pela cobertura plana que parecia flutuar sobre ela, sem revelar a sua estrutura portante.”(2)

A Classificação da Torre em 2002

Em 2002, a Torre foi classificada, nos termos da Lei em vigor, pela Assembleia Municipal de Palmela (AMP) a 25 de Junho de 2002 como Imóvel de Interesse Municipal, dada a sua reconhecida importância local.

Nessa data e também por proposta da Câmara Municipal de Palmela - que deliberou por unanimidade, em reunião pública 8 de Maio de 2002, ao abrigo da alínea b), do ponto 2., do artº 20º, da Lei nº 159/99 de 14 de Setembro, a classificação da Torre de Sinalização e Manobra da Estação Ferroviária de Pinhal Novo como Imóvel de Interesse Municipal – considerou-se a AMP que deveria ser dado conheciemnto do acto ao IPPAR no sentido de poder aquele organismo vir a atribuir-lhe uma eventual classificação como Imóvel de Interesse Público.

Quem foi o arquitecto Cottinelli Telmo ?

José Ângelo Cottinelli Telmo (n.1897- f.1948), concluiu o Curso de Arquitectura em 1920. Três anos mais tarde foi contratado com Luís Alexandre da Cunha para a Companhia dos Caminhos de Ferro Portugueses (C.P.). Iniciou funções na Divisão de Construção da empresa e passou, em 1927, para a Divisão de Via e Obras; ingressou no quadro em 1936.

Cottinelli foi também um dos dinamizadores do Boletim da CP - órgão de instrução profissional do pessoal da companhia, desenhou estudos para uniformes dos funcionários e um cartaz publicitário para os serviços, além de, na sua vertente de cineasta-documentalista, ter realizado três documentários acerca do quotidiano ferroviário e o conhecido filme A Canção de Lisboa (1933).

Na arquitectura são da sua autoria, por exemplo, a Estação Sul-Sueste (Terreiro do Paço, 1931), a coordenação geral da Exposição do Mundo Português (1940) e o Padrão dos Descobrimentos (em co-autoria com Leopoldo de Almeida), o Plano da Cidade Universitária de Coimbra (1943-48) e a Standard Eléctrica (1948)

NOTAS

1. MARTINS, João Paulo - Cottinelli Telmo / 1897-1948. A obra do arquitecto, 2 vols., Dissertação de Mestrado em História de Arte Contemporânea, Faculdade de Ciências Sociais e Humanas - Universidade Nova de Lisboa, 1995, pág. 278

2. Idem

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